26.5.12

Lama

Mário Vitória (2008). A caminho da macacada.
Acrílico s/ tela. 30x30 cm.

Ainda a pensar na poesia-denúncia de Laurie Anderson no espectáculo que vi no TA: Another Day in America, "histórias de Laurie Anderson sobre a vida na América contemporânea".

Uma (micro)história:
Desesperadamente à procura de inimigos que nunca mais chegavam, os EUA tornaram-se o seu próprio inimigo. Já não há um país, há um campo de batalha. Os campos de batalha têm leis próprias. A lei mais importante foi aprovada no final de 2011 pelo senado: é permitida a prisão por tempo indefinido.

Outra (micro)história:
As pessoas podem viver em casas que têm pianos brancos e cães que tocam piano. As pessoas podem não ter nada. Os que nada têm, normalmente já tiveram: uma casa sem pianos brancos e um trabalho.mas perderam tudo. Quando isso acontece, saiem das cidades e vão viver para florestas. Laurie tinha ouvido falar dessas pessoas e um dia decidiu visitá-las. Perto de Nova Iorque, mais precisamente em New Jersey. Chegou e disse Olá mas ninguém respondia. Enfim, acabou por aparecer uma mulher, uma assistente social que vivia naquele campo há cinco anos. Chorava muito. Laurie viu centenas de famílias que viviam em tendas na floresta.como há muitos anos atrás, antes de haver cidades.

Antes destas histórias, Laurie quis saber por que razão o nosso planeta se chama Terra. Não é um nome particularmente bonito. Sugeriu outros nomes. Um deles pareceu-me perfeito: planeta Lama. 

24.5.12

Laurie Anderson em Aveiro


O espetáculo tem como mote Another Day in America, "histórias de Laurie Anderson sobre a vida na América contemporânea". O concerto reunirá violino elétrico, teclas e eletrónica. "Peças de violino a solo tais como Flow from Homeland serão misturadas com sonoridades eletrónicas, de forma a introduzir uma visão íntima no estilo da escrita de canções".

Oh yes!

23.5.12

As with rosy steps the morn


Lorraine Hunt Lieberson - Händel - Theodora - As with rosy


Georg Friedrich Händel
THEODORA
(1750)

An Oratorio
Words by Thomas Morell



17. Recitative

(...)
Irene
Ah! Whither should we fly, or fly from whom?
The Lord is still the same, today, for ever,
And his protection here, and everywhere.
Though gath'ring round our destin'd heads
The storm now thickens, and looks big with fate,
Still shall thy servants wait on Thee, O Lord,
And in thy saving mercy put their trust.

18. Air

Irene
As with rosy steps the morn,
Advancing, drives the shades of night,
So from virtuous toil well-borne,
Raise Thou our hopes of endless light.
Triumphant saviour, Lord of day,
Thou art the life, the light, the way!
As with rosy steps. . .

20.5.12

Linda Sharrock


Linda Sharrock - Do You Remember?

Are you ready boots

Canção dedicadíssima ao ainda ministro Miguel Relvas (temos que ir por partes):

«These boots are made for walking, and that's just what they'll do
one of these days these boots are gonna walk all over you

You keep lying, when you ought...a be truthin'
and you keep losin' when you oughta not bet.
You keep samin' when you oughta be a changin'.
Now what's right is right, but you ain't been right yet.

These boots are made for walking, and that's just what they'll do
one of these days these boots are gonna walk all over you.

You keep playin' where you shouldn't be a playin
and you keep thinkin' that you'll never get burnt.
Ha!
I just found me a brand new box of matches yeah
and what he knows you ain't HAD time to learn.

These boots are made for walking, and that's just what they'll do
one of these days these boots are gonna walk all over you.

Are you ready boots? Start walkin'!»

Nancy Sinatra - These Boots Are Made For Walking (1966)

19.5.12

Warda al-Jazairia

Mais uma diva da música que desaparece: a árabe Warda al-Jazairia. Começou a carreira a cantar em Paris versões dos lendários egípcios Umm Kulthoum, Mohammed Abdelwahab e Abdelhalim Hafez. Pertenceu a muitos lugares. França (onde nasceu), Algéria e Líbano (ascendência), Egipto (onde residiu). Foi uma figura (política) controversa. «O seu apoio à Frente Nacional de Libertação (FLN) durante a guerra da Argélia forçou-a a deixar a França, em 1958. Refugiada, primeiro, em Rabat (Marrocos) e depois em Beirute (Líbano), Warda decidiu mudar-se para o Egipto, onde teve lições com os mestres que emulava. (...) Admiradora de Gamal Abdel Nasser e dos seus ideais pan-arabistas, Warda nunca perdeu esse fervor nacionalista. “El Ghala”, uma das suas canções, de um repertório que vendeu mais de 100 milhões de discos em todo o mundo, tornou-se controversa....» . ______ Uma vida que se cruza com a História de uma África que conhecemos mal.

17.5.12

Eivør

Eivør, num registo mais distante das Faroe Islands: Undo Your Mind.

Eivør Pálsdóttir

Eivør Pálsdóttir é originária das Faroe Islands, um arquipélago situado no mar da Noruega, muito próximo da Islândia, mas que pertence ao reino da Dinamarca! A mais recente descoberta!

14.5.12

Da Noite ao Silêncio


Bernardo Sassetti - Da Noite ao Silêncio

Uma peça musical pode conter a (precária)raridade que somos. Consistência e fragilidade.
Queremos pôr a mão no ombro do homem que compõe e executa. A peça compele à aproximação.
Se ele é já uma ausência. Descobrimo-nos incapazes ou absurdos. Tememos.

13.5.12

O Mistério de Teresa Salgueiro

I. Explicar às minhas filhas quem é a Teresa Salgueiro. Se é fadista? - não. É tipo a vocalista dos Deolinda? - não. Canta o quê? - Música portuguesa. (Vá, definam o estilo dos Madredeus a duas miúdas de 12 anos, não esquecendo de as motivar para o espectáculo que vão ver a seguir. Ah, elas gostam da Adele, mas também da Rhianna!). Ela canta MUITO bem, fez parte dos Madredeus - podem ouvir todos os CDs - e esse grupo teve imenso sucesso em todo o mundo, até no Japão! No Japão? - sim. E depois de vários anos a trabalhar juntos, decidiram separar-se. Desde há algum tempo, a Teresa Salgueiro tem projectos a solo.
Desconfiadas, foram ver o espectáculo. Primeira impressão: a sala está cheia de pessoas mais velhas, mesmo mais velhas do que eu! É um facto! E não percebo, juro que não percebo. Então agora os fãs dos Madredeus esqueceram ou rejeitam a vocalista! As músicas afinal eram tristes ou chatas, arrastavam-se qual filme de Manoel de Oliveira! Não percebo. A sala está cheia mas não há malta de 20/30 anos e a minha faixa etária também está mal representada. As miúdas têm razão: é só cabelos brancos!

Começa o espectáculo, ouve-se a primeira canção do novo álbum, "O Mistério". E só vos digo: a Teresa Salgueiro e a sua banda exige muito respeitinho. As minhas filhas perceberam o que é cantar irrepreensivelmente bem. Elas sabem, a voz que vem da garganta, o fôlego imenso, e parecer tão simples. E a presença em palco. Sempre contida, é certo. Mas a classe, senhores, a classe. Finalmente (mas não menos importante nestas idades), ela é bonita.


II. Agora eu. Não sei porquê, mas entro no Teatro e penso no Bernardo Sassetti. Vi-o tocar naquela sala. Mas não é isso. É ele todo, o músico e o homem. É a minha geração. Espero que a Teresa Salgueiro lhe dedique uma canção. Espero. Não sei porquê, parece-me bem. Ela não me fez a vontade, apesar de ter falado bastante sobre O Mistério. Há lá maior mistério que a morte! A verdade é que as canções são muito bonitas e a qualidade musical da banda, dos arranjos, a perfomance, é notável. Comovo-me às vezes. Continuo a pensar no Sassetti, enquanto sussuro beijos e pequenas atenções no ouvido das filhas. "Já viram que o contrabaixo está cortado?", "Ela parece uma odalisca, quando abre os braços e ondula as ancas!",....
As filhas vão-se enroscando à medida que as canções se sucedem. Mas não há canções de embalar. O ritmo é forte, o timbre poderoso, o silêncio desperta, há variações que nos fazem querer rodar na cadeira. Há espanto. Estava a ouvi-la e a vê-la e dei comigo a pensar nas minhas divas da América Latina, a postura séria, a voz que encarna uma causa. Teresa Salgueiro defende o conceito do mistério da vida, dos mistérios, fonte da nossa fragilidade e da nossa força. E a necessidade de manter a integridade do ser. Os cabelos compridos da Mercedes Sosa, da Lilla Downs. Um misticismo que-não-é-assim-tão discreto. Mas também ouço e vejo as minhas divas africanas e árabes, Magida El Roumi, Natasha Atlas, Fairouz, Om Lalthoumem. São algumas variações, a tónica musical, a contenção, os temas: a ausência do amado (ela poderia dizer habibi, em vez de meu amado, meu amor), os quatro elementos (a luz da manhã, a terra seca, o firmamento, oásis..., palavras que fixo). Há uma fusão de influências. O acordeão (Carisa Marcelino), a bateria e percussão (Rui Lobato), o contrabaixo (Óscar Daniel Torres) e a guitarra (André Filipe Santos) levam-nos numa viagem. Ouvimos tangos, ritmos tribais, danças do véu, trovas de ventos que passam e vão ficando, fados, toques jazzy, eu sei lá! Mas respiramos bem porque é tudo confusamente simples e harmonioso.
A alegria. Falta falar da alegria que vai crescendo. Eu acho que poderia ser maior ainda se os poemas tivessem sido renovados. Na obra da Teresa Salgueiro, ou neste álbum, isso não aconteceu. Comprei o CD e confirmo a impressão de que a escrita deve ter sido colectiva (como foi colectiva a composição musical). Os poemas não têm autor designado. A artista evoluiu, musicalmente surpreende. Mas as palavras, mesmo que inseridas noutras frases, são as mesmas. «Nas ondas do mar/na luz serena da chuva/eu sei. Aguardo as palavras/suspensas no silêncio/e vou». É belo mas é Madredeus e, naquela mesma voz, o verso belo parece gasto. Foi assim comigo.
De resto, só queria que ela tivesse feito uma pausa no seu imenso profissionalismo, no seu esquema impecável, e dissesse Bernardo Sassetti, o músico velado àquela mesma hora. É a nossa geração, Teresa Salgueiro.

11.5.12

Noite (Alice)


Tema principal do filme ALICE, de Marco Martins, gravado sete anos depois, na Timbuktu Solo Sessions.

Bernardo Sassetti (1970-2012)

Foto de Pedro Cunha

Tive a oportunidade e a felicidade de o ouvir várias vezes em espectáculos ao vivo. Creio que a primeira vez foi em 2005, no InJazz. Gostei tanto que escrevi, mal cheguei a casa :  Conhecerão o estilo. Intimista, emotivo, louco, contido, melódico. Virtuoso é claro, e mágico. Às vezes tinha a impressão de sonatas a quatro mãos, orquestra e coro. Mas era só ele, Bernardo Sassetti a solo.