30.10.07

Ópera Três Vinténs

Ópera "Três Vinténs" de Kurt Weil

Orquestra Sinfonieta da Esmae. Direcção Musical - António Saiote.
Encenação - Marcos Barbosa.
Coro – Estúdio Ópera do Departamento de Comunicação e Artes da Universidade de Aveiro.
Co-produção – Fundação João Jacinto Magalhães e Casa das Artes de Vila Nova de Famalicão.

No Teatro Aveirense, hoje, às 21:30h.



Adenda: Depois desta ópera de Kurt Weil, e tendo já visto Orfeu nos Infernos, não tenho dúvidas de que vou manter-me fiel aos espectáculos da Classe de Canto da Universidade de Aveiro. A encenação de Marcos Barbosa é fiel à intenção original da criação de um novo teatro musical: os conceitos de ópera e de teatro aliam-se com humor e eficácia. A tradução e a integração da mesma (texto) na dinâmica da peça foram decisões inteligentes. Cómica, poética, grotesca, agridoce, cruel, irónica, ontem reconhecemos o espírito Brechtiano. O público aderiu. Culpa nossa, Bertolt Brecht está longe de estar obsoleto.

21.10.07

Espírito Nativo

Jacqueline Mercado é mexicana, Pumacayo Conde é peruano, Rui Meira e Ricardo Gouveia são portugueses. Os quatro sentem passion pela música ibero-americana. Pesquisaram e dominam as outras personagens que entram no espectáculo: a quena, a flauta de pâ, o charango, o quatro venezuelano, o bombo leguero, congas, bongôs, chajchas, o palo de agua, clavas e maracas. Chacareras e zambas argentinas, huayños das comunidades andinas, cúmbias da Colômbia, joropos da Venezuela, rancheras mexicanas, um continente de ritmos e palavras. Ontem ouvi muito mais que este repertório. Estabeleceram pontes. O folclore português e o uruguaio, Victor Jara e Zeca Afonso, por exemplo.
Jacqueline e Rui Meira são ainda dotados de uma voz belíssima, caliente, portentosa. E têm alma.
O grupo chama-se Espírito Nativo (bom site) e pude ouvi-los no Cine Teatro de Estarreja. O público apreciou mas eram poucos os verdadeiros aficionados. A América Latina é um continente em via de descoberta e de reinvenção, mas é preciso navegar, pá. Do outro lado do mar não existe apenas o grande Brasil. O projecto ganha mais sentido por isso mesmo. A multiculturalidade assumida torna-os ímpares.
Atentem aos futuros concertos, procurem-nos. Deixaram-me uma fotografia de um espectáculo no Palácio Foz com os contactos escritos:
Tel: 966 555 809/966 497 225
espiritonativo@espiritonativo.com

Eu gostaria de os ouver mais por aí.

19.10.07

BS #11 Claude Nougaro

O seu mentor foi Georges Brassens. Foi poeta, pintor-desenhador, cantor de cabaret. Tornou-se um músico fantástico. mais um que Portugal não importou em vida: Claude Nougaro (aproveitem para ver no site a «ficção musical») (1929-2004).

TOULOUSE


TU VERRAS


ARMSTRONG


CINEMA

BS #10 Henri Salvador

Ele tem mais de 90 anos. Conheci-o quando vivia em França. De si próprio diz que inventou a Bossa Nova, porque influenciou João Gilberto, Jobim, Vinicius, de quem se tornou amigo nas suas andanças pelo Brasil há muitas décadas atrás. Ele era um francês da Guiana, trazia consigo essa mistura de influências, um dom para o jazz, uma forma de cantar baixinho, de quem parece que conversa, letras simples. Ri-se muito. As gargalhadas são sonoras, abertas, nada parecidas com as melodias que sussurra, que arrasta de forma tão sensual. Gosto dele. Por cá, poucos o conhecem. A língua francesa arrepia público. É pena. A língua francesa é como as longas caminhadas pelo meio de áleas. Já não se usam, o presente elegeu o jogging. Pena que se abandonem bons velhos hábitos sem pensar. A avidez pela novidade elimina demasiadas coisas saborosas. Henri Salvador é saboroso. muito saboroso. O seu canto é estranho familiar. Isso devia chegar.
Chambre Avec Vue, Perfomances (que inclui
Jardin d'Hiver), Ma chère est Tendre, Révérences são os últimos álbuns. Álbuns de 2000, 2002, 2003 e 2006. Henri tem quase cem anos. Jacqueline Garabedian esteve a seu lado durante vinte e seis anos. Henri ri e chora muito também. Quando o ouvimos cantar Avec le Temps (de Léo Ferré) pensamos na morte de Jacqueline e em todas as "nossas" mortes. Petit Fleur/Bonjour Sourire é assim uma coisa quase coquette, não é o Henri Salvador que ouço normalmente. Mas (também) faz parte da sua longa história.



HENRI SALVADOR


Si les fleurs
Qui bordent les chemins
Se fanaient toutes demain
Je garderais au cœur

Celle qui
S'allumait dans tes yeux
Lorsque je t'aimais tant
Au pays merveilleux
De nos seize printemps
Petite fleur d'amour
Tu fleuriras toujours
Pour moi

Quand la vie
Par moment me trahit
Tu restes mon bonheur
Petite fleur

Sur mes vingt ans
Je m'arrête un moment
Pour respirer
Ce parfum que j'ai tant aimé

Dans mon cœur
Tu fleuriras toujours
Au grand jardin d'amour
Petite fleur...

Dans mon cœur
Tu fleuriras toujours
Au grand jardin d'amour
Petite fleur...

[Foto: Henri Salvador et Annie Cordy em Bonjour Sourire de Claude Sautet, 1955]

7.10.07

LA FOULE

HIGELIN ET AGNES JAOUI

BS #9

Boris Vian tinha apenas trinta e nove anos quando morreu (1920-1959) mas teve tempo para ser, em simultâneo, engenheiro, inventor, músico e crítico de jazz, poeta, romancista, cenarista, tradutor, cronista, actor e intérprete das suas próprias canções. Receios?

"- E se, à ida, nos enganamos no caminho?
- Que mal faz? À vinda também o senhor se perde, e pronto."

in Boris Vian, O Outono em Pequim
Dom Quixote, 1989, pp. 65



LA JAVA DES BOMBES ATOMIQUES

Letra: Boris Vian. Música: Alain Goraguer 1955

Mon oncle un fameux bricoleur
Faisait en amateur
Des bombes atomiques
Sans avoir jamais rien appris
C'était un vrai génie
Question travaux pratiques
Il s'enfermait tout' la journée
Au fond d'son atelier
Pour fair' des expériences
Et le soir il rentrait chez nous
Et nous mettait en trans'
En nous racontant tout

Pour fabriquer une bombe " A "
Mes enfants croyez-moi
C'est vraiment de la tarte
La question du détonateur
S'résout en un quart d'heur'
C'est de cell's qu'on écarte
En c'qui concerne la bombe " H "
C'est pas beaucoup plus vach'
Mais un' chos' me tourmente
C'est qu'cell's de ma fabrication
N'ont qu'un rayon d'action
De trois mètres cinquante
Y a quéqu'chos' qui cloch' là-d'dans
J'y retourne immédiat'ment

Il a bossé pendant des jours
Tâchant avec amour
D'améliorer l'modèle
Quand il déjeunait avec nous
Il avalait d'un coup
Sa soupe au vermicelle
On voyait à son air féroce
Qu'il tombait sur un os
Mais on n'osait rien dire
Et pis un soir pendant l'repas
V'là tonton qui soupir'
Et qui s'écrie comm' ça

A mesur' que je deviens vieux
Je m'en aperçois mieux
J'ai le cerveau qui flanche
Soyons sérieux disons le mot
C'est même plus un cerveau
C'est comm' de la sauce blanche
Voilà des mois et des années
Que j'essaye d'augmenter
La portée de ma bombe
Et je n'me suis pas rendu compt'
Que la seul' chos' qui compt'
C'est l'endroit où s'qu'ell' tombe
Y a quéqu'chose qui cloch' là-d'dans,
J'y retourne immédiat'ment

Sachant proche le résultat
Tous les grands chefs d'Etat
Lui ont rendu visite
Il les reçut et s'excusa
De ce que sa cagna
Etait aussi petite
Mais sitôt qu'ils sont tous entrés
Il les a enfermés
En disant soyez sages
Et, quand la bombe a explosé
De tous ces personnages
Il n'en est rien resté

Tonton devant ce résultat
Ne se dégonfla pas
Et joua les andouilles
Au Tribunal on l'a traîné
Et devant les jurés
Le voilà qui bafouille
Messieurs c'est un hasard affreux
Mais je jur' devant Dieu
En mon âme et conscience
Qu'en détruisant tous ces tordus
Je suis bien convaincu
D'avoir servi la France
On était dans l'embarras
Alors on l'condamna
Et puis on l'amnistia
Et l'pays reconnaissant
L'élu immédiat'ment
Chef du gouvernement



JE BOIS

Letra: Boris Vian. Música: Alain Goraguer 1955

Je bois
Systématiquement
Pour oublier les amis de ma femme
Je bois
Systématiquement
Pour oublier tous mes emmerdements

Je bois
N'importe quel jaja
Pourvu qu'il fasse ses douze degrés cinque
Je bois
La pire des vinasses
C'est dégueulasse, mais ça fait passer l'temps

La vie est-elle tell'ment marrante
La vie est-elle tell'ment vivante
Je pose ces deux questions
La vie vaut-elle d'être vécue
L'amour vaut-il qu'on soit cocu
Je pose ces deux questions
Auxquelles personne ne répond... et

Je bois
Systématiquement
Pour oublier le prochain jour du terme
Je bois
Systématiquement
Pour oublier que je n'ai plus vingt ans

Je bois
Dès que j'ai des loisirs
Pour être saoul, pour ne plus voir ma gueule
Je bois
Sans y prendre plaisir
Pour pas me dire qu'il faudrait en finir...

Boris Vian, Le Déserteur


Le Déserteur é uma das canções mais célebres contra a guerra. Uma canção antimilitarista mas não "pacifista": os versos finais originais cantavam «Prévenez vos gendarmes, que je serai en arme et que je sais tirer». A canção nasce num contexto particular em França: a guerra da Indochina tinha terminado há pouco tempo e a guerra da Algéria começava.
O manuscrito da canção data de 15 de Fevereiro de 1954. Marcel Mouloudji foi o seu primeiro intérprete - numa emissão da Europe 1 (rádio) a 4 de Março de 1954 (com o último verso já modificado e com as referências ao «Président» substituídas por vagos "Messieurs»). Foi um escândalo.

Em Janeiro de 1955, Paul Faber, conselheiro municipal da cidade de Paris, reclama a censura da canção e consegue que Le Déserteur não volte a ser transmitido na Rádio. Boris Vian reage com ironia: declara que a sua canção é "nullement antimilitariste, mais, je le reconnais, violemment pro-civile". Envia uma
carta aberta a Paul Faber em que, entre outras coisas, reflecte sobre a expressão "Ancien combattant". Ainda hoje, este estatuto tem um peso considerável na sociedade francesa (o meu sogro, um "ancien combattant" obrigado a participar na guerra da Argélia, recebe, como tantos outros, bombons do Maire de Paris pelo Natal !). Segundo Boris Vian, os antigos combatentes não deveriam vangloriar-se de ter feito a guerra, mas antes lamentar a sua participação - "un ancien combattant est mieux placé que quiconque pour haïr la guerre". Boris Vian declarou ainda que a maioria dos verdadeiros desertores eram "anciens combattants" que não tiveram força para ir até ao fim do combate. "Et qui leur jettera la pierre ? Non. si ma chanson peut déplaire, ce n'est pas à un ancien combattant, cher monsieur Faber."

Censurada ou boicotada pela Rádio e pelas editoras, Le Déserteur caiu quase no esquecimento; Boris Vian morre em 1959; Marcel Mouloudji é banido da chanson française e condenado a uma espécie de exílio artístico que dura dez anos.

Será apenas em 1966, com a vaga de canções de protestos que se seguiram à revolta na universidade Berkeley contra a guerra no Vietname, que Le Déserteur é redescoberto por Peter, Paul and Mary (com o título The Pacifist), que a cantam em francês com uma curta introdução em inglês. Le Déserteur transforma-se no símbolo do movimento e dá a volta ao mundo.

Desde então, têm sido vários os intérpretes da canção. Serge Reggiani, Joan Baez - apenas para falar dos meus preferidos - cantaram Le Déserteur. Por cá, foi José Mário Branco que a cantou, entre 1966 e 1974, numa versão traduzida para a língua portuguesa.






Monsieur le Président
Je vous fais une lettre
Que vous lirez peut-être
Si vous avez le temps
Je viens de recevoir
Mes papiers militaires
Pour partir à la guerre
Avant mercredi soir
Monsieur le Président
Je ne veux pas la faire
Je ne suis pas sur terre
Pour tuer des pauvres gens
C'est pas pour vous fâcher
Il faut que je vous dise
Ma décision est prise
Je m'en vais déserter

Depuis que je suis né
J'ai vu mourir mon père
J'ai vu partir mes frères
Et pleurer mes enfants
Ma mère a tant souffert
Elle est dedans sa tombe
Et se moque des bombes
Et se moque des vers
Quand j'étais prisonnier
On m'a volé ma femme
On m'a volé mon âme
Et tout mon cher passé
Demain de bon matin
Je fermerai ma porte
Au nez des années mortes
J'irai sur les chemins

Je mendierai ma vie
Sur les routes de France
De Bretagne en Provence
Et je dirai aux gens:
Refusez d'obéir
Refusez de la faire
N'allez pas à la guerre
Refusez de partir
S'il faut donner son sang
Allez donner le vôtre
Vous êtes bon apôtre
Monsieur le Président
Si vous me poursuivez
Prévenez vos gendarmes
Que je n'aurai pas d'armes
Et qu'ils pourront tirer


Letra de Boris Vian - Música de Boris Vian e Harold Berg - 1954

[Download do mp3 aqui]

1.10.07

BS #8

Deixa lá recomeçar a série Banda Sonora. Mais uma mulher, africana, nascida no Benim, Angélique Kidjo. ou como a cultura popular pode desafiar a autoridade e o status quo.
e estabelecer parentescos entre nações.

CONGOLEO


TUMBA


VOODOO CHILD (de JIMI HENDRIX)


Com Henri Salvador, ela canta LE MONDE COMME UN BÉBÉ no álbum Oyaya! Mas fiquei orfã de mp3. Deixo-vos JARDIN D'HIVER de HENRI SALVADOR, para imaginarem a fusão das duas vozes. Sabe a pouco, eu sei, sabe a tanto.



[Arquivo BS do D&C: 7, 6, 5, 4, 3, 2, 1, e continuem a ouvir o Banda Sonora no RCP]