6.9.07

A canção do que dorme

Subo ao sono
Os seus degraus são sete
Tu estás no sono
Elegia daquelas que partem
E um ícone de reprovação

Subo ao sono
Os seus degraus são sete
Exactamente

E nada acontece
Ou termina!
Acendo a luz
Para que os mortos vejam o sono.


Ghassan Zaqtan
in O Estado do Mundo
Fundação Calouste Gulbenkian/Tinta da China
2007, pp. 66


Acendam a luz por Pavarotti, falecido hoje. Acendam a luz por Eduardo Prado Coelho - cujas crónicas lia raramente sabe-se lá porquê, mas que me ofereceu «Os Universos da Crítica» aos vinte anos e deu vida neste país à figura de uma ciência que nunca deixou de me fascinar, a semiologia. Acendam a luz por Ingmar Bergman que, com «O Sétimo Selo», me fez acreditar na morte como um deus. um dia conto-vos. Acendam a luz por Antonioni que engrandeceu, blow-up, Vanessa Redgrave, um beijo, um parque e uma morte, fundindo ilusão e realidade. Façam-no também por Francisco Umbral que me disse «(E) como eram as ligas de Madame Bovary». Acendam a luz pelos 14 civis mortos na madrugada de hoje num bairro de Bagdad, enquanto dormiam, na sequência de um ataque aéreo americano. Todos desaparecidos enquanto tomava banhos de sol e de mundo ou me arranjava para o trabalho, distraída a viver.
Para que vejam o seu sono, e nós o nosso. Mesmo que nada aconteça, ou termine.

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