Ouvia-a aqui e roubei-a à má fila. Com oito anos sabia esta canção de cor. e cantei-a (quem não cantou?) durante anos. de tal maneira que no exame final da 4ª classe fiz uma composição sobre uma gaivota. Lembro-me vagamente do conteúdo, sei que o protagonista era uma gaivota-pomba da paz que voava voava e transformava os lugares por onde passava. A composição foi considerada a melhor do distrito no ano de 1975/76. O 25 de Abril tinha sido ontem e, conscientemente ou não, eu apoiava a revolução. ou não fossem sempre as escolas instrumentos políticos do poder vigente. antes tinham servido (ferozmente) a propaganda salazarista.
Éramos livres, ou queríamos ser livres, mas demorámos algum tempo a sê-lo. A liberdade exigiu aprendizagem. Em Outubro de 1974, no início do novo ano lectivo, as reformas estavam ali, visíveis naquela escola. Na sala, as paredes estavam despidas de Salazar e Caetano. Mantinha-se o crucifixo, que ninguém muda a mentalidade de professores com dezenas de anos de carreira de um dia para o outro. O 1° ano tinha pela primeira vez classes mistas, para gáudio dos mais velhos, como eu, que com as colegas de turma inventávamos casamentos entre meninos e meninas de 6 anos. Ainda me lembro do meu casal preferido, a Clarinha e o Nuno (pobres vítimas da Revolução!). Deixou de haver um muro a separar o edifício dos rapazes e o das raparigas e isso era estranhissímo. Nos anos anteriores era expressamente proibido passar o muro para o outro lado, o castigo era grande para quem o fizesse e, de repente, não havia muro, e éramos convidados a usar todo o espaço do recreio. Nunca consegui atravessar o muro que já não existia. Lembro-me perfeitamente de sentir que continuava a infringir qualquer lei. Quando os rapazes passaram a ocupar o "nosso" espaço, não gostei. As brincadeiras deles eram mais violentas. Um dia, uma bola mal lançada atingiu-me no estômago, fiquei sem conseguir respirar por uns momentos; quando recuperei fui ter com o miúdo e ordenei furiosa: "volta para o teu recreio!".
Quando penso na votação do concurso Grandes Portugueses, ou nas manifestações pró-fascistas e xenófobas dos últimos tempos, penso sempre que há gente que ainda não aprendeu o novo espaço de liberdade. Quando se zangam, continuam a gritar: "volta para o teu recreio!"
Não sei é se isso acontece por só terem passado 33 anos, ou se acontece por já terem passado 33 anos! Viver em liberdade exige aprendizagem, mas também memória.
Éramos livres, ou queríamos ser livres, mas demorámos algum tempo a sê-lo. A liberdade exigiu aprendizagem. Em Outubro de 1974, no início do novo ano lectivo, as reformas estavam ali, visíveis naquela escola. Na sala, as paredes estavam despidas de Salazar e Caetano. Mantinha-se o crucifixo, que ninguém muda a mentalidade de professores com dezenas de anos de carreira de um dia para o outro. O 1° ano tinha pela primeira vez classes mistas, para gáudio dos mais velhos, como eu, que com as colegas de turma inventávamos casamentos entre meninos e meninas de 6 anos. Ainda me lembro do meu casal preferido, a Clarinha e o Nuno (pobres vítimas da Revolução!). Deixou de haver um muro a separar o edifício dos rapazes e o das raparigas e isso era estranhissímo. Nos anos anteriores era expressamente proibido passar o muro para o outro lado, o castigo era grande para quem o fizesse e, de repente, não havia muro, e éramos convidados a usar todo o espaço do recreio. Nunca consegui atravessar o muro que já não existia. Lembro-me perfeitamente de sentir que continuava a infringir qualquer lei. Quando os rapazes passaram a ocupar o "nosso" espaço, não gostei. As brincadeiras deles eram mais violentas. Um dia, uma bola mal lançada atingiu-me no estômago, fiquei sem conseguir respirar por uns momentos; quando recuperei fui ter com o miúdo e ordenei furiosa: "volta para o teu recreio!".
Quando penso na votação do concurso Grandes Portugueses, ou nas manifestações pró-fascistas e xenófobas dos últimos tempos, penso sempre que há gente que ainda não aprendeu o novo espaço de liberdade. Quando se zangam, continuam a gritar: "volta para o teu recreio!"
Não sei é se isso acontece por só terem passado 33 anos, ou se acontece por já terem passado 33 anos! Viver em liberdade exige aprendizagem, mas também memória.
2 comentários:
tinha eu essa idade e uma irmã com dois anos apenas.
Ensinei-lhe o Somos Livres, toda.
E ela cantava-a, direitinho...
E eu pensava : lembrar-te-ás disto, daqui a vinte, trinta .. anos?
Qual cobaia, elaq cantou, cantou, cantou....e esqueceu!
:)***
:)
Pois, eu tinha mais que dois anos, não esqueci. e foi estranho e delicioso perceber que as minhas filhas de sete anos aprenderam esta canção na escola. (mas acho que elas vão esquecer)
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